Entendendo a Ansiedade

Entendendo a Ansiedade

Entre os transtornos mais romantizados, banalizados, normalizados (chame como quiser) das redes sociais, acredito que, depois do TOC (transtorno obsessivo-compulsivo, vou escrever sobre isso um dia) e do TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade), vêm os transtornos de ansiedade, principalmente a própria ansiedade, que nem é um transtorno, mas todo mundo trata como se fosse um. Os transtornos vão ficar para outro dia. Hoje vamos falar só de ansiedade.

Mas o que é a ansiedade?

Amanhã eu conto.

A ansiedade é uma resposta natural do corpo ante a possibilidade de uma ameaça. A ansiedade é diferente do medo porque o medo é uma reação ante uma ameaça real. Em outras palavras: se você está andando na selva, peladão como veio ao mundo, e de repente escuta as folhas se mexendo em uma moita, e você acha que sente que algo ali que pode te fazer mal, você tem ansiedade. Se uma onça pula da moita na sua frente, lambendo os beiços, salivando e andando lentamente na sua direção, o que você sente medo, não ansiedade.

Talvez não tenha nenhum monstro ali… talvez tenha…

Agora, imagine essa situação quando a humanidade estava nos seus primórdios, as cidades ainda não existiam, os seres humanos viviam na caverna… a pessoa que decidia fugir antes de ver o predador, muito provavelmente, tinha muito mais chances de escapar com vida do que aquela que esperava ter certeza de que realmente era um predador. Quem vive mais tempo tem mais tempo para procriar e passar suas características adiante. Então sim, quem era mais ansioso propagou sua herança genética para muito mais pessoas do que quem não era ansioso.

Porém, eu tenho uma surpresa para você que está lendo este artigo: nós não moramos mais no meio do mato (embora algumas potenciais ameaças possam estar nos espreitando). Agora temos cidades, onde nossos potenciais predadores são nossos semelhantes, onde, na maioria dos casos, nossas situações de risco chegam através de uma chamada telefônica, ou um e-mail de um chefe ou de um cliente, onde certos rituais de iniciação da vida tribal adulta se chamam vestibular, e quem não for aprovado tendo vivido menos de um quarto da vida será mal visto, e nunca mais terá um emprego bom, onde escolhemos nossos líderes e, cada vez que eles fazem algo errado, nós temos de pagar e, por isso, nosso esforço árduo de trazer comida para casa talvez não seja suficiente para todo o mês, e por aí vai…

Um herói é um covarde que não teve tempo de fugir

O que acontece é que nossas respostas fisiológicas não evoluíram o suficiente para acompanhar a todas estas mudanças. Hoje, essas ameaças não oferecem necessariamente o mesmo risco que ofereciam aos nossos ancestrais das cavernas. Hoje , a grande maioria das nossas ameaças, na verdade, são problemas.

Quer dizer que: quando o telefone toca de madrugada por conta de algum problema, quando você precisa fazer uma prova difícil, quando você está com pouco dinheiro e um imposto novo é anunciado, aumentando o preço de tudo, quando você precisa falar em público para várias pessoas que vão te julgar e condenar se você disser uma coisa errada, quando o/a crush te liga e você não sabe o que dizer e morre de medo de estragar tudo… o corpo te prepara da mesma forma que preparava o homem das cavernas para fugir ou lutar contra a onça que poderia estar ali te espreitando.

O que acontece quando a ansiedade “dispara”?

Para enfrentar um oponente maior que você (ou pra fugir dele), você precisa de certas condições físicas… e de energia, muita energia. Quando a possibilidade de uma situação problema ou uma ameaça surgem, a adrenalina é liberada causando algumas reações bem características:

  • Dilatação das Pupilas, afinal, você precisa de um campo de visão maior
  • Sensação de perda de controle dos esfíncteres e diarréia, já que para lutar ou fugir, você precisa ficar mais leve
  • Palidez (em alguns casos, até vertigens), já que o fluxo de sangue é redirecionado para os membros, principalmente os inferiores (já que você precisa correr… MUITO!)
  • Você para de prestar atenção aos detalhes, a quem está perto de você, às vezes nem escuta o que estão de dizendo, por conta de um fenômeno chamado tunelamento da visão e audição, já que você precisa estar 100% focado no seu predador e na fuga. Em outras palavras, se você está caindo de um prédio e precisa se segurar em algum lugar, pouco importa a cor do prédio.
  • Aumento do ritmo e da força dos batimentos cardíacos, levando também a um aumento da pressão arterial, já que você precisa do corpo extremamente acelerado para poder reagir aos estímulos o mais rápido possível
Laranja me dá azar

Se a ansiedade persiste, o corpo também começa a liberar mais cortisol, que é conhecido popularmente como o hormônio do estresse. Este hormônio, entre outras coisas, afeta o corpo de duas formas principais:

  • Provoca resistência à insulina (para que você tenha uma disponibilidade energética maior na corrente sanguínea)
  • Diminui a necessidade de sono pela inibição da produção de melatonina (ainda que este hormônio seja crucial para o estabelecimento do ciclo circadiano, em excesso, ele vai diminuir a produção de melatonina), já que você precisa estar esperto e ligado para evitar o predador.

Baseado nisso tudo, é importante deixar algumas coisas claras e resumir outras:

  • Por pior que seja uma crise de ansiedade, você não vai morrer, mas não é por isso que não precisa tratar.
  • O cortisol é normalmente alto pela manhã e vai baixando até a noite, quando o corpo começa a produzir melatonina e você tem sono e dorme, eliminando o cortisol.
  • Com o estresse crônico e níveis de cortisol aumentados frequentemente, os riscos de diabetes aumentam, já que o pâncreas vai produzir muito mais insulina.
  • É muito fácil se acostumar a dormir mal.

O que fazer quando a ansiedade “dispara”?

É importante lembrar que a ansiedade existe para salvar nossa vida na iminência da presença de um problema, e que ela está diretamente ligada com o que se chama “reação de luta e fuga”. Assim como também é importante lembrar que a ansiedade vai fazer você ter muita energia liberada na corrente sanguínea. Porém a ansiedade não é como ligar a televisão: você não aperta um botão mágico que vai disparar. Essa sensação vem aos poucos, até atingir um nível máximo.

Se você sente que a ansiedade está “começando”, e você sabe disso porque você conhece o seu corpo… pode ser a boca seca, as mãos suando… enfim, aquele desconforto… existem algumas técnicas que você pode utilizar como o redirecionamento da atenção, a respiração diafragmática, ou mesmo esfregar um pouco de gelo ou uma garrafa de água gelada nos pulsos ou na nuca. Agora, se a ansiedade já está lá, com o coração disparado, respiração alterada… essas técnicas muito provavelmente não vão funcionar. Aí, o que você precisa fazer é gastar essa energia.

E para gastar essa energia, você não precisa procurar um leão para sair no soco.  Você pode fazer atividades físicas de baixa intensidade como uma caminhada leve, limpar a casa, lavar a louça… enquanto você pensa em alguma coisa diferente do que te causa ansiedade. Ou você tomar um banho gelado. O mecanismo por trás do banho gelado ainda é misterioso: pode funcionar porque existe uma desconexão extrema entre a sua atenção e o mecanismo que causa a ansiedade, ou pode ser porque existe um gasto de energia do organismo para conservar a temperatura, ou pode ser uma combinação dos dois.

Não precisa ser tão gelado… mas eu garanto que este cara não está ansioso…

Como prevenir e como tratar as crises ansiedade?

É importante lembrar que a ansiedade não tem cura porque não é uma doença ou um transtorno. É uma reação normal do organismo. Porém, quando a ansiedade começa a se manifestar sem causa aparente, ou em situações indesejadas e que causem prejuízo, o ideal é buscar ajuda profissional.

Crises de ansiedade podem ser prevenidas através de mudanças no estilo de vida. Procure fazer atividades físicas regularmente, diminuir o tempo de tela e ter uma rotina regular de sono.

Para tratar crises de ansiedade, o melhor a fazer é procurar ajuda profissional. Cada dia que você evita uma situação por medo de uma crise de ansiedade, essa ansiedade vence, e só tem uma pessoa que sofre com isso: você.

Quer resolver esse problema de ansiedade e ter um estilo de vida melhor? Me conta a sua história no luisborin@luisborin.org, ou deixa seu comentário.

 

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