Porque às vezes sair da cama é um sacrifício

Porque às vezes sair da cama é um sacrifício

A cama

Ninguém sabe como começa. Mas um dia, você simplesmente não quer levantar. Você não quer levantar, não porque a cama está aconchegante e convidativa, mas porque você não quer ter que atravessar o dia que você tem pela frente. E isso se repete todos os dias.

Outras pessoas dirão que não é bem assim: ao invés disso, você simplesmente não quer ir dormir, e luta contra o sono o máximo que podem, porque sabem que o dia seguinte vai ser exatamente igual ao dia de hoje, isso se o dia for bom.

Também tem as pessoas que simplesmente não conseguem dormir, ou porque os sonhos não deixam, ou porque a ansiedade não deixa, e com isso, todo o ciclo circadiano acaba ficando alterado, o estresse aumenta e as habilidades de encarar os problemas diminuem.

Dormir é ruim… acordar é muito pior…

A comida

A comida perde o sabor, como aquele poema que o Gollum recita em O Senhor dos Anéis: “E pouco a pouco vamos esquecendo o gosto do pão“. Como a comida não tem gosto, comer perde o sentido. Você come cada vez menos, porque comer é uma atividade que perdeu o sentido.

Aquela macarronada de domingo costumava ser tão boa…

Menos quando é o fast food. Aquela comida gordurosa tem um sabor especial, do tipo que você poderia comer o dia inteiro ali e tudo estaria bem. As cores do ambiente ao redor até voltam a aparecer, junto com todo o açúcar do refrigerante! Até que a comida acaba. Mas você sempre pode comer mais… e mais… e mais… E você, de repente, se dá conta de que, junto com essa explosão de sabores, você pode engolir toda essa tristeza, essa anedonia, essa falta de sentido na vida, então você continua comendo…

Você se identificou?

Segundo a Organização Mundial da Saúde (2023), cerca de 5% dos adultos no mundo inteiro padecem de algum transtorno depresivo. Isso quer dizer uma em 20 pessoas. Assim, se você conhece 19 pessoas e nenhuma delas tem depressão… é bom se cuidar.

Não se sabe ao certo quais são as causas da depressão, mas existem muitas teorias. Hoje em dia, a teoría mais furada utilizada é a teoria do desbalanceamento químico dos neurotransmissores no cérebro e, por conta disso, milhões de pessoas no mundo inteiro tomam uma medicação que já foi provada várias vezes como placebo antidepressivos. Eu, particularmente, acredito que existam várias doenças que causam sintomatologia similar e, por isso, são todas agrupadas sob o mesmo guarda-chuva chamado “depressão”.

Se você se identificou, a primeira coisa que você precisa saber é que é possível te ajudar, e que você não está sozinho, não é fraco, e que as coisas tem sim como melhorar.

Independentemente de qual seja a causa, o tratamento para a depressão é cognitivo-comportamental. Isso quer dizer que são trabalhadas as crenças do indivídio sobre si mesmo, sobre o futuro e sobre o mundo (segundo a tríade de Beck), ao mesmo tempo que são trabalhadas as condutas que mantém o transtorno depressivo funcionando.

Mas eu sempre ouvi falar que depressão tem causa orgânica e precisa do antidepressivo para funcionar mais rápido que a terapia

Sim, todo mundo já ouviu falar nisso. E quando você vai no psiquiatra ou em qualquer médico, a primeira coisa que te fazem, em menos de 10 minutos de conversa, é te diagnosticar com algum transtorno depressivo e te dar a medicação, porque esse é o protocolo oficial de muitos países. E eu nem vou dizer que a ideia dos antidepressivos como placebo é nova, já faz pelo menos uns 15… 20 anos que se sabe que eles não funcionam.

E outra coisa que só te contam (quando te contam) na consulta é que o antidepressivo demora de 4 a 6 semanas para fazer efeito. Qualquer psicoterapeuta sério que trabalhe com algum enfoque cognitivo-comportamental consegue fazer você se sentir muito melhor em um mês… um mês e meio (faça as contas das semanas). Outra coisa muito importante para dizer sobre os antidepressivos é que eles podem causar uma piora inicial e até mesmo pensamentos suicidas nos pacientes, então se você começou a se tratar agora e o mundo parece estar mais pesado, ou se você está dizendo coisas para você mesmo que você nunca disse antes e que não gostaria de dizer, lembre-se: não é você, é a medicação. Converse com alguém e, principalmente, fale com o seu médico.

“Se tem efeitos colaterais que o médico disse, também deve ter efeitos positivos que o médico também disse.” A noção de tempo distorcida e a falta de perspectiva de futuro muitas vezes fazem o paciente depressivo não buscar ajuda.

Enfim, não sou eu quem vai dizer: pare de tomar antidepressivos. Isso é o trabalho do seu médico (caso você esteja passando em um). E se os antidepressivos estão dando algum resultado (e provavelmente eles vão dar, já que o conceito de placebo é a melhora do paciente mesmo sem tomar algum princípio ativo), excelente. Mas não deixe de procurar a terapia. Um bom psicólogo vai te ajudar a colocar as ideias no lugar e, mais importante construir uma vida que vale a pena viver.

Mas como ficar falando da minha vida com alguém vai me ajudar?

Segundo a criadora da terapia dialético-comportamental (que é uma das famosas terapias cognitivo-comportamentais da terceira geração), Marsha Linehan, a proposta é “criar uma vida que valha a pena ser vivida“. Quando você conversa com o seu terapeuta sobre o que você faz e o que você deixou de fazer, sobre o que você pensa e sente e o que você deixou de pensar e sentir, é possível trabalhar não a causa, mas o que mantém toda essa atmosfera depressiva funcionando.

É importante lembrar que o processo terapêutico é sempre um processo ativo de mudança. A participação do paciente é sempre muito importante para atingir os resultados necessários. Falando nisso, você sabia que pacientes depressivos têm muita dificuldade em definir objetivos? E que quando um objetivo mal definido não é atingido, o paciente se afunda cada vez mais na depressão? Pois é. Quer um exemplo de meta mal definida? “Ser feliz“. Quer outra? “Receber um aumento de salário“. Sabe por que essas metas são mal definidas? Porque falta muita definição. O que é ser feliz? De quanto é esse aumento de salário? Quando você quer receber esse aumento?

Atividades físicas e um gato! Essa sim é uma vida que vale a pena viver. Sério, faça atividades físicas regulares. É parte do tratamento.

É aí que entra o terapeuta. Por ser uma pessoa de fora, o terapeuta pode te ajudar a definir essas metas, além de passar atividades que serão executadas entre as sessões (sim, especialmente em transtornos depressivos, fuja de terapeutas que não te dão nenhuma tarefa para casa). Essas tarefas são muito importantes para estabelecer hábitos mais saudáveis, seja fisicamente, mentalmente, depende muito da pessoa.

E aí? Você tem passado por essas situações? Conhece alguém que está passando por isso? Você não precisa se sentir sozinho. Me escreve por WhatsApp, ou no meu email luisborin@luisborin.org.

Ou comenta aí na página o que você achou do texto. Particularmente, eu acho este um tema tão complexo que vai ter que ter parte 2, parte 3…. para poder explorar o tema mais a detalhes.

 

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